Em meio a uma pandemia sem precedentes, um tema que se destacou, sem dúvida, é o do acesso à água. Além da dificuldade de ficar em casa e manter o distanciamento social, as populações vulneráveis ficaram ainda mais fragilizadas pela simples falta de água para lavar as mãos. Esse problema, é claro, não é de hoje. No Brasil 35 milhões de pessoas ainda não têm acesso ao abastecimento de água potável, segundo o Instituto Trata Brasil. Por isso, foi com muito entusiasmo que ajudamos a elaborar uma campanha da Fluxus Design Ecológico no Instagram, sobre iniciativas inspiradoras para o manejo integrado da água.
O objetivo foi apresentar soluções muito bacanas para a gestão e manejo da água que existem no Brasil e no exterior. Por exemplo, uma residência em São Paulo construiu jardins e cisternas que captam, filtram e permitem reaproveitar a água cinza produzida ali. Tem também um consórcio de municípios da região de Penápolis, no interior do estado de São Paulo, que fez todo um trabalho de manejo de solo, de educação ambiental e de intervenções na paisagem para proteger o único rio que abastece de água os municípios daquela área. E há iniciativas como o da Filadélfia, nos Estados Unidos, que pretende transformar a histórica cidade em um lugar repleto de calçadas e telhados verdes, jardins de chuva e outras infraestruturas verdes para absorver a água da chuva.
A Fluxus reuniu 11 iniciativas como essas em uma publicação chamada “Iniciativas Inspiradoras para o Manejo Integrado da Água em Ambientes Urbanos”. Foi elaborada em parceria com a Aliança pela Água, uma articulação da sociedade civil criada na época em que a região Sudeste sofreu uma de suas piores crises hídricas, em 2014-15. A publicação saiu em 2018, mas com todo o debate em torno da água se intensificando e com eleições municipais a acontecer neste ano, a Fluxus achou que agora era uma boa hora para divulgar as iniciativas. Ela queria mostrar que, não importa o tamanho ou escala do projeto, é possível encontrar formas de usarmos bem esse recurso tão importante que é a água e, mais ainda, de convivermos melhor com ela.
Foram quatro semanas de postagens, de segunda a sexta, em que seguimos quatro temas como norte: manejo da água da chuva, abastecimento, águas servidas (esgoto) e recarga de aquíferos. O resultado foi um crescimento orgânico de 20% no número de seguidores da conta da Fluxus, além de consultas e contatos de pessoas que queriam saber mais sobre alguns projetos ou fazer os seus próprios.
Uma coisa muito bacana que aprendemos com este trabalho foi que existe algo chamado reidratar a paisagem urbana. Mais do que olhar para a água apenas do ponto de vista funcional, trata-se de torná-la de novo parte da paisagem, algo a se acolher e não a se evitar.
Quantas vezes vimos quintais de casas serem totalmente impermeabilizados, ou canaletas e calçadas serem feitas com o objetivo único de escoar a água da chuva ou da lavagem do quintal o mais rápido possível, e para longe? Pois a proposta com jardins de chuva, calçadas e telhados verdes, bem como de projetos que implantaram grandes áreas de infiltração de água em cidades mundo afora, é fazer com que a água fique onde ela caiu. Sem risco de causar enchentes, mas, sim, com o propósito de permitir que ela infiltre no solo, recarregando lençóis freáticos e aquíferos locais, garantindo assim que nascentes, rios e lagos continuem tendo água.
Muitas soluções não requerem grandes obras, mostram as iniciativas inspiradoras reunidas pela Fluxus. Plantas selecionadas corretamente, mais o solo e os microrganismos que vivem neles ajudam a filtrar e limpar a água, antes de ela penetrar em áreas mais profundas e abastecer corpos d’água. Cisternas e uma engenharia hidráulica inteligente permitem aproveitar a água da chuva ou a água cinza produzida em casas e prédios para irrigar jardins e lavar áreas externas. Isso economiza na conta de água, demanda menos água potável oferecida pelas empresas de abastecimento e ainda recria conexões com a natureza.
Um exemplo são os jardins de chuva no Largo das Araucárias, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Dutos foram instalados para direcionar a água da sarjeta para esses jardins. A proposta é que a água da chuva seja filtrada pelas plantas e penetrem no solo, ali mesmo. Isso ajuda a evitar alagamentos na região, sem falar que a paisagem e o microclima local ficam muito mais agradáveis.
Essas soluções são indicadoras de caminhos para lidar com esse recurso natural de uma forma mais inteligente e sustentável. Torcemos para que apareçam mais iniciativas inspiradoras para a água!
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